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quarta-feira, 1 de março de 2017

Balanço do Oscar 2017


Este balanço do Oscar 2017 será, ainda uma vez, elíptico – como sempre, não consegui ver todos os indicados. Quem acompanha aqui os posts anuais sobre o assunto sabe que eles são invariavelmente antecedidos por preâmbulos explicativos sobre a não objetividade da premiação, ou o caráter endógeno de Hollywood – que inventou uma categoria para premiar os filmes estrangeiros justamente para separá-los da produção norte-americana. Raros, raríssimos artistas estrangeiros, falando suas línguas maternas, conseguiram arrebatar os cobiçados prêmios de Melhor Ator e Atriz, por exemplo – Roberto Benini ao que eu me lembre é a exceção, mas a xaropada dos campos de concentração que é A Vida é Bela (1998) só tem de exógena a língua, empregando até a medula a estética mainstream americana. 

Daí ao prêmio de melhor atriz ir às mãos de Emma Stone – que, sendo uma ótima jovem atriz, está a anos luz da esplendorosa Isabelle Huppert. Ridículo é compará-las, absurdo é colocá-las em pário de igualdade na disputa por um prêmio (como fora anos atrás a disputa entre Enmanuelle Riva e Jennifer Lawrence). A derrota da madura atriz francesa sobre a moçoila estadunidense – num caso como no outro – simboliza, de modo mais geral, a infantilização da sociedade norte-americana (e, por extensão, da nossa, nós que a consumimos tão entusiasticamente), e, num contexto cinematográfico, a morte da cinefilia. A vitória altissonante de La La Land – apesar do rolo insólito atinente ao prêmio de Melhor Filme – deixa isso claro: em terra que dá as costas à história, repudiando o passado por velho, a novidade banal ganha foros de conquista extraordinária. 
Considerando as diretrizes do Oscar, extraordinário é quando acontecem no evento coisas disruptivas, a exemplo do equívoco de se entregar o prêmio principal da noite ao filme errado. Em tempo real, milhões de espectadores ao redor do mundo viram a vida imitar a arte. Spoiler: ao final de La La Land, o bem-sucedido jazzista vê seu grande amor d’outrora, agora uma atriz renomada, sair de seu “clube” hipster nos braços de outro. Dado o lamentoso presente consumado, ele prefere refugiar-se na fantasia, refazendo mentalmente o percurso de ambos, do primeiro encontro à reviravolta do destino, de modo a perpetuar a união do par romântico, nem que seja apenas no plano imaginativo. A imposição stricto sensu da clássica “magia” de Hollywood fecha a película. O sonho dourado cala a realidade. 
Quando foi anunciado o recorde de indicações a La La Land, perguntei-me se, num tempo de alçamento ao poder do ultraconservador Trump, valia a pena perpetuar-se esta versão algodão-doce da vida. Eu não sou seu negro, ótimo documentário indicado à premiação da categoria, lança luzes sobre o histórico apagamento dos afro-americanos da cinematografia pátria – espelhamento da segregação racial em voga até os anos 70. O filme trabalha com os diários de James Baldwin, escritor negro amigo de Martin Luther King, Medgar Evers e Malcom X – três mártires da causa da igualdade. A violência do preconceito é materializada, no filme, por dois heróis tipicamente americanos, a girl next door Doris Day e o machão John Wayne. 
A destruição do índio pelo branco ganha, pelo cinema clássico, foros de saga de construção da nação. A “pureza branca” simbolizada por Doris Day anula outros matizes – a voz poderosa de Lena Horne soa na banda sonora do documentário, lembrando dos muitos papéis que o preconceito racial vetou a atriz de ter (o mais notório é o da comediante negra de Show Boat, filme que questionava justamente a lei que proibia o casamento inter-racial). 
É tempo de se questionarem as mitologias inventadas por Hollywood, e de se inventarem novas mitologias, que lancem luzes sobre esses tempos lúgubres que vivemos. O quiproquó referente à premiação final do Oscar serviu para ilustrar – à la La La Land – qual o resultado de se premiar a frivolidade saltitante. Tivemos chances de escutar a uma carrada de discursos do mais motivacional e nefasto teor do keep dreaming: sonhe, os sonhos se transformam em realidade se você lutar com força suficiente, etc. etc. A alva meritocracia neoliberal foi colhida em pleno voo, e ao seu discurso sucedeu-se um bem-vindo libelo em favor da igualdade. 
No âmbito artístico, sem ser uma obra-prima, Moonlight conta com sensibilidade a história de um menino negro nascido em meio ao tráfico em Atlanta – capital da Georgia, destruída durante a Guerra Civil: a mãe viciada, o bullying e o homossexualismo são a base de uma história que não trata em primeiro plano do preconceito racial, talvez porque ele seja a pedra angular daquela sociedade: a comunidade pobre/ negra habita os arredores da boca comandada por um chefe a quem Chiron toma como sucedâneo de pai. Sua aderência à vida do crime parece um caminho óbvio depois do reformatório, não tivesse o seu melhor amigo de colégio seguido o caminho contrário, encarando uma vida de legalidade – e o labor que ela significa, especialmente para alguém recém-saído da prisão. Quase todo subjetivo e elíptico, o filme evita a dicotomia e a moralização. Fá-lo com bastante precisão e raras vezes resvala à estetização. Seu mérito principal está em dar voz e subjetividade a uma personagem historicamente apagada da cinematografia do Norte – ou retratada, como o escravo “Pai Thomás” vituperado por James Baldwin, como mártir dócil. Baldwin gostaria um bocado deste filme. Se o Oscar raras vezes tange a esfera artística, este ano ele merece loas por ter decidido ser político. 
Com relação aos demais indicados, o mais bem-resolvido esteticamente é A Chegada. Lion seria uma obra-prima de melodrama não se arrastasse tanto na primeira parte (nem mesmo o pequeno e carismático Sunny Pawar impede, ali, a sua lassidão). A surpresa, para mim, foi Manchester à beira-mar, cuja montagem em síncopes sublinha a inabilidade da personagem principal com o seu entorno. E que personagem principal! Onde estava eu este tempo todo que nunca vira Casey Affleck? (O talento é de família). 
No mais, as injustiças costumeiras: Viola Davis, protagonista feminina de Um limite entre nós, foi mal colocada no rol das coadjuvantes. O prêmio era, aqui, de Nicole Kidman. O (ótimo) Dev Patel idem por Lion – neste sentido, Mahershala Ali, também de Moonlight, foi muito bem escolhido como vencedor. A estratégia de se reduzir a categoria do sujeito para viabilizar-se a sua premiação repete-se todo ano, e vez por outra dá resultado. No que toca aos filmes estrangeiros, nada vi dos indicados além do iraniano O Apartamento, o vencedor. Resta a ser revisto. A opção por Asghar Farhadi – diretor da, esta sim obra-prima, Separação – me pareceu preguiçosa. Na primeira visita, achei um bom filme, um pouco perdido, no entanto, em meio ao rol de temáticas que arrola: a metalinguagem, o machismo e conservadorismo daquela sociedade, o trauma. Não tem o pulso do Filho de Saul, Separação ou Ida, os premiados dos anos anteriores. 
Levando-se em conta as diretrizes do Oscar, este ano o resultado foi acima do esperado. Pelo tapete vermelho passaram as mais variadas nacionalidades e etnias. Entre indicados e vencedores, consagraram-se temáticas variadas: o lugar da mulher no interior de uma cultura machista, a inserção do negro na sociedade norte-americana, o homossexualismo... Abriram espaços para novos sonhos, multicolores. Dado o papel imperativo do Oscar, prêmio da mais influente cinematografia mundial, isto não é pouca coisa.

sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015

Oscar 2015: Balanço geral e lista dos melhores, versão Filmes, filmes, filmes!

Oscar. A relação dos indicados invariavelmente me perturba – as mediocridades escolhidas para os grandes prêmios (e que às vezes se sagram vencedoras); o desnível existente entre os artistas indicados à determinada categoria, visando-se claramente o benefício de um em detrimento dos outros; as distorções que ocorrem entre os indicados a uma categoria, mas não à outra complementar. Porém, sempre acabo me rendendo à lista dos melhores, geralmente convidada pelas colegas blogueiras que há anos alimentam com incrível pertinácia o “DVD, Sofá e Pipoca”. Sou pro diabo nostálgica; à cada lista lembro-me de minhas primeiras, de quando torci para Coração Valente ou O Resgate do Soldado Ryan, das manhãs insones no colégio depois de passar a madrugada comemorando as vitórias de Titanic ou de Shakespeare Apaixonado (ah, a adolescência...). 
Mas, vamos logo à ação. 
Eddie Redmayne e Felicity Jones em
A teoria de tudo
Para ser sincera, só agora eu pude ler com cuidado a relação dos indicados a todas as categorias. Daí o frescor da minha surpresa publicada acima... Alguns ótimos filmes compõem a lista dos melhores: Boyhood, Whiplash, O Jogo da Imitação, A Teoria de Tudo. Sobretudo Birdman (ou A inesperada virtude da ignorância), que para mim é desde já um dos grandes filmes da Sétima Arte, merecendo com louvor a estatueta. Razões para isso valem um post particular, que surgirá no momento oportuno: a agudeza na escolha do tema – o rolo compressor da indústria cultural –; do protagonista Michael Keaton, uma vítima do sistema, até outro dia um antigo super-herói, de aparente irreversível decadência (ele mereceria o Oscar pela abnegação com que mergulha no seu ridículo e cativante alter-ego). Voltaremos a isso. 
Ainda não vi Sniper Americano e Selma. O primeiro é, dizem, de um americanocentrismo sem tamanho, mas até agora Clint Eastwood não me deu motivos suficientes para que eu desconfiasse de sua perspicácia como diretor. Opinarei, no entanto, depois de vê-lo. Já O Grande Hotel Budapeste é, para mim, o Os Miseráveis deste ano. Como o outro, um filme reverberante e vazio. Foge-me o porquê de um e outro terem caído nas graças do público (lembro-me dos equilibrados franceses, a aplaudirem entusiasticamente ao fim da sessão de Os Miseráveis à qual assisti em Paris – sessão da qual eu fiz força para não fugir, aliás). Sem problemas; ele certamente será batido por concorrentes de melhor cepa. 
Michael Keaton em Birdman
Birdman é uma daquelas preciosidades nas quais há simbiose perfeita entre tema e forma. Portanto, não dá para premiá-lo sem reconhecer, também, a excelência de seu diretor, Alejandro Gonzáles Inárritu. Ou a montagem brilhante, que constrói cinematicamente a onipresença do personagem-protagonista, misturando, além de tudo, os tempos do teatro e do cinema, artes com especificidades diferentes. Mas, pasmo, Birdman não concorre ao prêmio de melhor montagem! E aquela trilha-sonora que é o coração da obra – como a bateria é o coração das bandas de jazz e rock –; seca, agressiva, uma saraivada de balas, por que não concorre como melhor trilha sonora? 
J. K. Simmons em Whiplash
Mas, há algo mais curioso: a trilha que é o próprio tema de Whiplash também ficou de fora da disputa... Whiplash, aliás, protagoniza outra distorção do Oscar 2015. J. K. Simmons, seu protagonista indiscutível, concorre, nele, como ator coadjuvante. Vai ser premiado, pois há, ali, espaço para ele deslindar a sua excelência. Porém, a justiça pediria que ele dividisse a categoria com Keaton e companhia, deixando o prêmio para um vero coadjuvante (eu torceria para Ethan Hawke). 
Mas o pário será duro entre os protagonistas. Além do já citado Keaton, há duas pérolas: Benedict Cumberbatch e Eddie Redmayne. Ambos representam o que há de melhor no Oscar: de repente, um ator obscuro – pode ser um super-herói de blockbuster (à la Birdman) para o qual a gente não dá muito, um galanzinho aparentemente sensaborão de comédia romântica, ou um participante discreto de um all star picture – deixa-nos com a respiração suspensa, por personificarem a excelência que o Oscar tanto almeja (e raramente atinge). 
Benedict Cumberbatch e Keira Knightley
em O Jogo da Imitação
No início do ano passado, eu disse que o até então para mim desconhecido Cumberbatch era o que de melhor havia em Álbum de Família, e apostava em sua indicação como coadjuvante. A indicação não veio, mas surgiu uma chance melhor para que brilhasse esse ator que, no final das contas, não era tão desconhecido assim (é um bem reputado Sherlock Holmes de uma série que eu nunca vi, e ator nas franquias Star Trek e Hobbit). 
Já o nome de Eddie Redmayne não me dizia nada, até que eu abri sua página do IMDB e o descobri fazendo parte de tudo. Do execrável Os Miseráveis, de Sete Dias com Marilyn, de séries de TV e filmes adolescentes. Redmayne não desempenha Stephen Hawking, é o próprio. Mas, sua premiação, que para mim é certa, deixa-me na boca um gosto agridoce. Ele desempenhou o protagonista almejado pelo Oscar – distorceu-se fisicamente até atingir o talhe de seu retratado. Porque ele o faz muito bem, eu o congratulo de antemão. Porém, porque eu acho que atuação não seja só isso; que conta a artesania, a emoção, a despersonalização até que se atinja a alma (não só o físico) do outro, meu coração fica com Cumberbatch. Que maravilha poder ainda encontrar, na embonecada Hollywood, esses tipos que não são nem bonitos, nem feios. São o personagem; do personagem. Não vou me esquecer tão cedo do rosto de Benedict Cumberbath ao cabo de O Jogo da Imitação, já visitado pela insânia, enrijecido pela impossibilidade de exacerbação de seu amor proibido. Lembrou-me outro grande, Michael Fassbender, igualmente aterrador e maravilhoso em Shame
Julianne Moore em Para sempre Alice
Entre as atrizes, há uma Julianne Moore que reputam excelente pela sua performance em Para sempre Alice, filme ao qual eu não assisti. Rosamund Pike, muito bem pelo já aqui comentado Garota Exemplar; Resse Witherspoon, correta em Livre – um bom filme, mas com uma protagonista feminina um tanto quanto morna (melhor é o papel de coadjuvante, que possivelmente dará o Oscar a Laura Dern). Marion Cotillard, não pelo seu tour de force em Era uma vez em Nova York, mas sim por um filme francês (Dois dias, uma noite, dos irmãos Dardene – ao que tudo indica, uma obra bem atual, que se debruça sobre o rescaldo da crise europeia). De todas as que vi, a que mais me surpreendeu foi Felicity Jones, que eu supunha uma cantora pop (?) até que, passeando por sua página no IMDB, vi-a como protagonista de uma porção de comedinhas que passei da idade de assistir. Ela venceu admiravelmente o desafio imposto, ombreando-se ao seu brilhante coprotagonista, em A Teoria de Tudo
Emma Stone em Birdman
Por fim, duas palavras sobre as atrizes coadjuvantes e os filmes estrangeiros. Todas estiveram muito bem (não vi apenas Meryl Streep). Keira Knightley está uma atriz cada vez mais bem-preparada. Patricia Arquette, ótima – numa obra tão cheia de qualidades, mas que tem o azar de competir com uma safra excepcionalmente boa de filmes. Laura Dern é o ponto alto de Livre, e merece o prêmio que vai ganhar. Mas, meu coração – de novo ele – é de Emma Stone, atriz luminosa, a melhor de sua geração, excelente no pequeno papel que lhe deram no grande Birdman
Timbuktu
No que toca aos filmes estrangeiros, a seleção é a melhor em muito tempo. As apostas, pelo que vi, estão entre Timbuktu e Leviatã. Qualquer um dos dois mereceria a estatueta, e também Relatos Selvagens ou Ida. Ida é low profile. Não faz grande uso estético da paleta do cinza, mas conta com qualidade a história da jovem noviça, que subitamente se descobre a judia cujo único remanescente familiar é uma tia que é o seu avesso. Já Relatos... é um desbunde cinematográfico, mas demasiado artificioso – revi-o recentemente, me deleitei durante a exibição, mas ele me deixou tão logo eu deixei a sala. O tempo arrastado do princípio de Leviatã me perturbou um pouco. E Timbuktu não me abandonou até hoje. Malgrado a artificialidade romanesca que costura a história (o filme foi rodado na Mauritânia), o tema é demasiado pungente (os desmandos do talibã e as consequências de sua "guerra santa", sobretudo para as mulheres) e a fotografia, arrebatadora demais. Meu Oscar de filme estrangeiro vai para ele. 

E agora, os meus pitacos para este ano (desta vez, seguindo a razão...): 



Melhor filme: Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) 
Melhor diretor: Alejandro González Inárritu - Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)
Melhor atriz: Julianne Moore - Para Sempre Alice 
Melhor ator: Eddie Redmayne - A Teoria de Tudo 
Melhor ator coadjuvante: J.K. Simmons - Whiplash: Em Busca da Perfeição 
Melhor atriz coadjuvante: Laura Dern - Livre 
Melhor canção original: "Glory", por John Legend, Common - Selma 
Melhor roteiro adaptado: Graham Moore - O Jogo da Imitação 
Melhor roteiro original: Alejandro González Iñárritu, Nicolás Giacobone, Alexander Dinelaris, Armando Bo - Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) 
Melhor longa de animação: Como Treinar o Seu Dragão 2 
Melhor documentário em longa-metragem: Citizenfour 
Melhor longa estrangeiro: Timbuktu (Mauritânia) 
Melhor fotografia: Emmanuel Lubezki - Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)
Melhor figurino: Milena Canonero - O Grande Hotel Budapeste 
Melhor documentário em curta-metragem: Crisis Hotline: Veterans Press 1 
Melhor montagem: Boyhood - Da Infância à Juventude 
Melhor maquiagem e cabelo: Frances Hannon, Mark Coulier - O Grande Hotel Budapeste
Melhor trilha sonora: Johann Johannsson - A Teoria de Tudo 
Melhor design de produção: Maria Djurkovic, Tatiana Macdonald - O Jogo da Imitação
Melhor animação em curta-metragem: The Feast 
Melhor curta-metragem: The Phone Call 
Melhor edição de som: Martín Hernández, Aaron Glascock - Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) 
Melhor mixagem de som: Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância) 
Melhores efeitos visuais: Interestelar