quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

"White Christmas": a canção de Irving Berlin em dois musicais de Hollywood

Há exatos setenta anos, o compositor Irving Berlin escreveu esta que considero a mais linda canção de Natal de todos os tempos. "White Christmas" foi apresentada ao público pela primeira vez por meio da poderosa voz de Bing Crosby, numa apresentação do artista no show The Kraft Music Hall, veiculado pela rádio NBC no Natal de 1941.
No entanto, a música começou a trilhar carreira de sucesso (também na voz de Bing Crosby) apenas em meados de 1942, ao circular comercialmente no álbum com as canções do recém-lançado filme musical "Holiday Inn", protagonizado por Crosby e Fred Astaire. Lançado o filme, "White Christmas" competiu pela preferência do público com "Be careful, it's my heart", outra canção bem Irving Berlin, singela e linda. Porém, hoje o espaço é da primeira, pois já estamos em contagem regressiva para a chegada do Papai Noel e compartilhamos com os norte-americanos dos anos 40 da ânsia por canções que definam essa magia quase tangível que acompanha o Natal.
"Holiday Inn" foi lançado nos Estados Unidos em agosto de 1942. Pouco mais de um mês antes do Natal de 1942, a canção tornou-se a preferida dos ouvintes segundo vários hit parades do país, incluindo a rádio das Forças Armadas, inundada com pedidos da música, segundo registros. Hoje, seu single é considerado o mais bem vendido de todos os tempos, com impressionantes 50 milhões de cópias vendidas no mundo todo.
Trago essas informações históricas (emprestadas do canal do You Tube que apresenta a primeira versão da música para as telas) para pensar nos vários sentidos que "White Christmas" ganhou com o passar dos tempos. Naquele 1942 e anos subsequentes, ela ajudou a aquietar corações de soldados e familiares divididos pela 2ª Guerra. Seu eu-lírico pode bem ser considerado um daqueles jovens que partiam para o horror desconhecido munidos daquele patriotismo exacerbado que os americanos sabem como ninguém ostentar, e, distante de sua terra e de seus entes queridos, sonhava com os "Natais Brancos" de outrora: "Eu sonho com um Natal Branco/ Igual àqueles que eu conhecia/ Onde os topos das árvores brilham/ E as crianças ficam atentas/ Para ouvir os trenós na neve". Tranquilos que não vou mais continuar a minha tradução paupérrima da canção - para não ser acusada daquilo que critico: as versões malfeitas que não conseguem repor nem o sentido, nem a poesia dos originais. Fiquem com a obra-prima:
I'm dreaming of a white Christmas
Just like the ones I used to know
Where the treetops glisten,
and children listen
To hear sleigh bells in the snow
I'm dreaming of a white Christmas
With every Christmas I write
May your days be merry and bright
And may all your Christmases be white
Com duas estrofes e nove versos e a descrição de um pequeno quadro de felicidade familiar, Berlin conseguiu como nenhum outro suavizar a atmosfera de tensão da época. Interessante é que o primeiro uso cinematográfico da música não a relacionou à Guerra.

"Holiday Inn" também não tematiza o Natal - embora a data abra e feche a película que narra as aventuras e desventuras amorosas de um par de comediantes (protagonizados por Fred e Bing, dois dos artistas mais badalados do show bizz no momento). O título refere-se à pousada/restaurante administrada pela personagem de Bing, que, curado de um recente ataque de nervos, decide fundar um estabelecimento que apenas precise abrir nos feriados nacionais. E assim, Mark Sandrich (diretor de 5 das 10 películas de Ginger Rogers & Fred Astaire - só isso já serve para recomendá-lo) faz desfilar em frente ao espectador uma patriótica parada em comemoração às datas principais do calendário americano: Dia de Ação de Graças, 4 de julho, aniversário de Abraham Lincon, Páscoa, etc.
O humor que perpassa a história é quebrado nos dois momentos em que "White Christmas" é apresentada, os quais narram com a mesma doçura dois momentos fundamentais para as personagens de Bing Crosby e Virginia Dale: primeiro, quando os dois começam a se conhecer enquanto dividem de modo familiar uma noite de Natal na pousada em vias de ser inaugurada; e segundo, o reencontro de ambos, já apaixonados, na frieza do estúdio de Hollywood que transforma em filme a já então bem-sucedida pousada. A união do casal, debaixo da reprimenda do diretor, ressalta ainda uma vez o clima de acolhimento familiar promovido pela música. Mais que a badalação da Meca do cinema, a qual copiava (e copiava às vezes mal, segundo a personagem de Crosby) a realidade, tudo o que os pombinhos precisavam era um do outro. Sim, é piegas, mas funciona perfeitamente. 

"White Christmas" deu nome a um típico filme de Natal que começou a ser exibido nos Estados Unidos em outubro de 1954 - isto, bem como o fato de o nome do compositor anteceder o título do filme, patenteiam como Berlim e sua música gozavam da admiração do público.
Nesta película, a 2ª Grande Guerra ocupa papel de destaque, quem sabe, mimetizando a importância que a canção tivera naqueles últimos anos da conflagração.
"White Christmas" trata de modo quase que documental das confraternizações que aconteciam no front e dos destinos de seus combatentes. Talvez por isso, eu não consigo deixar de ficar engasgada sempre que ouço Bing Crosby cantando-a entre escombros, acompanhado apenas por uma caixinha de música e tendo como pano de fundo um conflito que não dá trégua.
O patriotismo tipicamente americano aparece nesta obra na defesa dos generais do passado - homens que, embora tenham comandado exércitos vencedores na Guerra, não encontravam trabalho naqueles anos 50. A visada crítica não torna, entretanto, a história amarga. Ao contrário, ela brilha, especialmente devido às presenças de Vera-Ellen e Danny Kaye, que, além de dançarem como ninguém, estão divertidíssimos como dois artistas do teatro cômico-musicado que não querem saber de compromisso mas - oh, graciosa obviedade - descobrem no final que não podem viver separados. E, antes de tudo, há a voz de Bing Crosby, levando "White Christmas" a se sobrepor aos ruídos da Guerra.
*
Antes de apresentar a cena, quero deixar a todos os amigos queridos que passam por aqui meus mais sinceros votos de um Feliz Natal. Quer seja ele um Natal Branco, com direito à construção de bonecos de neve e regado à bebidas quentes, quer seja um Natal colorido, iluminado pelo céu azul do verão - que chega aqui nos trópicos mais animado do que nunca. Desejo-lhes um Natal cheio de paz, seja ela encontrada em meio à família numerosa, em clima de festa, com troca de presentes e as crianças esperando o Bom Velhinho, seja ela encontrada na quietude do lar, num jantar simples do qual compartilham apenas os de casa. O meu, mesmo abafado, terá como trilha sonora "White Christmas" e outras maravilhas criadas pelos grandes compositores americanos, as quais, mesmo pintando cenários que nos são estranhos, definem lindamente o espírito natalino. Espero que nos encontremos no ano que vem com a mesma frequência e entusiasmo com que nos encontramos durante todo este ano!

12 comentários:

História é Pop! disse...

Amo esse filme, as músicas, acho que um dos melhores musicais de natal da época de ouro do cinema amo ver Bing Crosby e meu mais que adorado Fred Astaire dançando e cantando. Nunca esqueço da cena em que Astaire está bêbado dançando na festa(rs) ele era um espetáculo em todos os sentidos!!!
Queria comentar mais sobre “Natal Branco” mas estou com uma cervicalgia e mal estou conseguindo postar no meu blog.
Bjo

C.M disse...

Ainda não vi esse filme, mas vou procurar por aqui. Linda a canção, acho que até os dias de hoje todos nós sonhamos com um "White Christmas" né? Estou te seguindo, adorei o blog. bjs e feliz Natal !

angela disse...

Uma delicia de post e as musicas são lindas realmente.
Um Natal feliz para você cheio de alegria com todos que ama.
beijos
Angela

Edison Eduarddo disse...

Desde menininho que na época do Natal ouço "white christmas" mas o filme ainda não tive a oportunidade de ver... Dani, desejo a ti e toda família um NATAL maravilhoso, cheio de presentes, alegrias e felicidades!!! Que o Papi Noel seja bem generoso... São os meus sinceros votos!

Danielle Crepaldi Carvalho disse...

Olá, queridos!

Obrigada pelos votos de Feliz Natal.

Júnia, espero que você melhore logo!
Ah, essa cena que você citou é também uma de minhas preferidas do filme. Adoro essa estravagância vinda de Fred Astaire, que fazia números sempre tão elegantes. Outro número que acho muito divertido é o do minueto que ganha compassos de jazz e de swing - no qual ele e Virginia Dale usam perucas do tempo da monarquia.

C.M., eu também sonho passar um "Natal Branco"!
Fico feliz por você ter se empolgado com os filmes e que esteja seguindo o blog. Vou adorar receber suas visitas e comentários!

Ângela, Edison, muito obrigada pelos votos! Edison, os dois filmes são uma ótima ideia para essa época de Festas.

Pessoal, como nenhum desses filmes está disponível para compra no Brasil (que novidade!...), baixei os dois do http://www.monova.org/
As legendas em português dos dois estão disponíveis no http://www.opensubtitles.org/pt

Bjocas
Dani

Anônimo disse...

Danielle, entrar no seu Blog é viajar no tunel dos filmes mais lindos, é uma dádiva descrita por muitos fãs: Bjs

Danielle Crepaldi Carvalho disse...

Oi, Nina!

Que lindas suas palavras! Fiquei muito feliz!

Bjinhos
Dani

Camila Henriques disse...

Oi Dani! Desculpa a ausência na caixinha de comentários do seu blog, mas é que eu ainda tô aprendendo a administrar meu tempo com o meu estágio! :)

Enfim... compartilho da sua opinião - White Christmas é a canção mais bela, das natalinas que eu conheço. Ainda não vi nenhum dos dois filmes, confesso que estou fraca de Bing Crosby... a última coisa que assisti dele foi Alta Sociedade, um remake não tão bom quanto o original, Núpcias de Escândalo. Mas já anotei, mais dois filmes pra lista dos que eu devo assistir em 2011!

Foi muito bom te "conhecer" esse ano, Dani. Muito obrigada pelos comentários no blog, e pelas dicas maravilhosas de filmes que assisti e que ainda vou assistir! Adorei nosso contato, mesmo que pela internet :)



Um felis 2011!

Danielle Crepaldi Carvalho disse...

Oie, Camila.

Pra mim também foi um grande prazer conhecer você esse ano e trocar contigo ideias sobre filmes (e outras coisas mais)! Adoro como o blog encurta as distâncias e coloca em contato pessoas com interesses semelhantes!

Sei bem o que é tentar enlouquecida dar conta de faculdade e de trabalho, das disciplinas e de projeto de pesquisa. Já fiquei vários anos sem férias por causa disso...

Sobre os filmes, acho que você vai gostar bastante deles. Meu preferido é "Holiday Inn", no qual as canções estão mais claramente relacionadas às personagens e que é divertido sobretudo porque o Fred faz papel de "vilão" (!), até onde sei, uma novidade considerando os musicais que fez em Hollywood.

Eu adoro a voz do Bing Crosby, mas só outro dia comecei a ir em busca dos filmes protagonizados por ele.

Vi High Society e compartilho de sua opinião. "Núpcias de Escândalo" é minha comédia preferida - os diálogos são super afiados, a direção é primorosa e a química entre a Kate Hepburn, o James Stewart e o Cary Grant é irresistível. Eu tento não comparar filmes mas é impossível não fazê-lo nesse caso. o Frank Sinatra, o Bing Crosby e a Grace Kelly parecem tão pouco à vontade em High Society!... Além disso, convenhamos que Grace não é uma grande atriz. Ela é linda, mas desempenha com frieza do começo ao fim aquele papel feminino maravilhoso, em que Katharine Hepburn dá um show.

Querida, beijinhos e um maravilhoso ano de 2011 pra você!

Dani

Danielle Crepaldi Carvalho disse...

:D Animação, colega!

As Tertulías disse...

Minha "Luz", amei a postagem (apesar dea char os dois films chatérrimos - bem, principalmente o primeiro que assisti há tres mil anos no Museu de Imagem e do Som... nas escuras épocas (The dark ages) em que tínhamos no Rio uns 5 ou 6 canais de TV, e videos, DVDS, Blue-Rays eram coisas tipo "Enterprise". Obrigado por tudo isso e por muito mais: pelo carinho, amizade, prestígio e incentivo! Amiga de Valinhos - da próxima vez que for ao Brsil VAMOS nos conhecer, OK? FELIZ ANO NOVO!!!!

Danielle Crepaldi Carvalho disse...

KKKK, Ricardo, morri de rir com seu comentário! Estou me divertindo com a telenovela "Vale Tudo", lançada na época em que o videocassete era o supra-sumo da tecnologia e os filmes clássicos só chegavam nas casas de quem os importava - ou então, estavam disponíveis nos "cineclubes". É impressionante a revolução tecnológica que ocorreu nos últimos 20 anos!

Sobre os filmes, acho o primeiro mais bem amarrado que o segundo, embora ele tenha uns momentos meio amargos que o fazem se afastar do que costumamos ver nos filmes natalinos. Mas White Christmas também tem uns momentos que o fazem valer muito a pena, mesmo não sendo uma maravilha.

Querido, quero te desejar um especialíssimo ano de 2011. Você sabe que tenho um grande carinho por você, né? Adorei o acaso que nos uniu (na verdade, não foi o acaso, e sim o post com os links do "Arséne Lupin" inserido por mim no http://filmesatuais-psique66.blogspot.com/, você se lembra!

Bjocas. Espero que nosso ano de 2011 seja repleto de tertúlias e de filmes, filmes, filmes!!!

Dani