sábado, 10 de outubro de 2009

Classic Cinema Survey

Segundo a Meredith, follower desse blog, "A Noodle in a Haystack started this survey. Keep it going!". Ok, Mer! Lá vamos nós! And in Portenglish, so that we understand each other!

1. What is your all-time favorite Clark Gable movie?
Aconteceu naquela noite ("It happened one night", 1934). Não de Gable mas de todos os tempos. He deserved the Oscar he received for this one!


2. Do you like Joan Crawford best as a comedienne or a drama-queen?
Drama-Queen! Ela está linda (gorgeous) em "Mildred Pierce" (1945).

3. In your opinion, should Ginger Rogers have made more musicals post-Fred Astaire?
Não (No, no, no)! Onde já se viu a Ginger dançando com outro. Eles foram feitos um pro outro. Seria traição! rsrsrs.


4. I promise not to cause you bodily (or any other serious) harm if you don't agree with me on this one. So please be honest: do you like Elizabeth Taylor? Hm?
Não é uma das minhas preferidas, mas eu gosto muito dela em "A megera domada" ("Taming of the shrew", 1967).


5. Who is your favorite off-screen Hollywood couple?
Spencer & Katharine.



6. How about onscreen Hollywood couple?
Katharine & Spencer.
A imagem é um fotograma da "Costela de Adão" ("Adam's rib", 1949). Wonderful one!


7. Favorite Jean Arthur movie?
"O galante Mr. Deeds" ("Mr. Deeds Goes to Town", 1936). I agree with Meredith!
Na verdade, vi poucos filmes dela...


8. What was the first Gregory Peck movie you saw?
"A princesa e o plebeu" ("Roman Holiday", 1953). Preferidíssimo!


9. What film made you fall in love with Alfred Hitchcock? (And for those of you that say, "I don't like Hitchcock" -- what is wrong with you?!)
"Quando fala o coração" ("Spellbound", 1945). Não só pelo Hitch mas também pela Ingrid.


10. What is your favorite book-to-movie adaption?
"Por quem os sinos dobram" ("For whom the bell tolls", 1942). Vi os rostos dos artistas do filme em cada uma das página daquele livro enorme - inclusive das páginas em que a adaptação nem tocou.


11. Do you prefer Shirley Temple as a little girl or as a teenager?
Ela até que é bonitinha, mas... de nenhum dos dois jeitos... (None of the alternatives)


12. Favorite character actor?
Marlon Brando. The best and the cutest.


13. Favorite Barbara Stanwyck role?
Terá que ser "Adorável vagabundo" (péssimo título para "Meet John Doe", 1941), o único filme que vi com ela.


14. Who is your favorite of Cary Grant's leading ladies?
Humm. Katharine Hepburn.



15. Bette Davis or Joan Crawford?
Bette Davis. Amo a "Estranha passageira" (Now Voyager, 1940) desde que era criança.


16. What actors and/or actresses do you think are underrated?

Marilyn, com certeza, que era feita para o gênero cômico.


17. What actors and/or actresses do you think are overrated?
Will Smith! Chatérrimo... Boooring!



18. Do you watch movies made pre-1980 exclusively, or do you spice up your viewing-fare with newer films?
No prejudice! Aliás, este daqui de baixo é o que mais assisti e assisto até hoje... Simply love it!



19. Is there an actor/actress who you have seen in a film and immediately loved? If so, who?
Vários: Audrey Hepburn, Carole Lombard, Ginger Rogers, Gene Kelly.


20. Gene Kelly or Fred Astaire?
Thoughy indeed, Meredith. Mas eu não consigo escolher.


21. Favorite Ginger Rogers drama?

Humm... Storm Warning (1951)


22. If you wrote a screenplay, who would be in your dream cast and what roles would they play? (Mixing actors and actresses from different generations is allowed: any person from any point in their career.)
Colocaria Ingrid Bergman, Greta Garbo e Katharine Hepburn disputando Cary Grant (the three of them fighting for Cary would be scary to see...). Suponho que daria algo do tipo do "Whatever happened to Baby Jane"...

23. Favorite actress?
Ingrid Bergman.


25. Favorite actor?
Marcelo Mastroianni.


26. And now, the last question. What is your favorite movie from each of these genres:

Drama: "Crepúsculo dos Deuses" ("Sunset Boulevard", 1950). Definitely!


Romance: Nesses últimos tempos é "Boêmio Encantador" ("Holiday", 1938).


Musical
:
"Cantando na chuva" ("Singin' in the rain", 1952). Desculpe a obviedade...


Comedy: "Núpcias de Escândalo" ("Philadelphia story", 1940). The best of all times!


Western: "Onde começa o inferno" ("Rio Bravo", 1959) foi o único que vi sem querer ir dormir. Don't like this genre much!


Hitchcock (he has a genre all to himself): Impossible! Mais fácil apontar os que mais vi: "39 degraus" (39 degrees, 1935); "Spellbound", "Notorious" ("Interlúdio", 1946), "Um corpo que cai" ("Vertigo", 1958); "Janela Indiscreta" ("Rear window", 1954).

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Quando nada acontece na tela: Amantes (Two lovers, 2008)

Do volume de filmes que vejo, tem sido meu costume comentar aqui os que prefiro. Hoje, abro uma exceção para falar sobre esse filme estranho que vi faz alguns dias.
Estranho não quer necessariamente dizer ruim. As várias resenhas sobre ele, que li depois de sair do cinema, demonstram que o filme satisfez uma porção de gente. Eu efetivamente não fui uma delas.
A explicação disso talvez esteja no chiste que a personagem de Audrey Hepburn faz em "Quando Paris Alucina (Paris when it sizzles, 1963), esse sim, um de meus favoritos. O filme da Audrey faz uma divertida leitura sobre o processo de produção de uma obra cinematográfica. Audrey representa uma taquígrafa contratada por um roteirista que deseja alinhavar em dois dias o script de um filme. Ao mergulharem no trabalho intenso, ambos dão a ver ao público a maquinaria da maior indústria de cinema do mundo - Hollywood: a necessidade de o filme terminar com a aproximação das duas cabeças muito bem pagas que trocarão aquele beijo responsável pela venda de pipocas e ingressos do cinema. A brincadeira com a conhecida fórmula de sucesso de Hollywood se soma às espinafradas dadas em alguns cineastas ditos cult, que, segundo a personagem de Audrey, constróem um filme pela negação. Daí os títulos paródicos "A festa que não aconteceu"; "Nenhuma dança nas ruas", etc.
Vendo "Amantes", me senti em contato com um desses pseudo cults ironizados pela taquígrafa atilada - que, aliás, convence o roteirista (interpretado por William Holden) a escrever um roteiro mais real, mais otimista, enfim, mais hollywoodiano.
Não defendo apenas os filmes que seguem a fórmula antiga e conhecida. Não é um grande problema quando as coisas efetivamente não acontecem num filme, mas sim quando elas deixam de acontecer em virtude de uma tentativa mal-sucedida do diretor de se afastar dos padrões. Isso - é o que ocorre em "Amantes" - faz com que o filme se torne falso, postiço.
Que nome dar para aquela fotografia titubeante que parece ter sido produzida por alguém com vertigem? Ela cairia bem se encontrasse alguma contrapartida na história, mas não parece ser esse o caso. Se ela tivesse sido usada para refletir o estado de perturbação e alheamento do protagonista, talvez a cena do primeiro jantar devesse ser tomada da distância, e não por meio de primeiríssimos planos de cada um dos pratos. E os diálogos fajutos, pobres mesmo, semeados pelo roteiro: "Você é um doido?", "Não.". E aquele (disforme) triângulo amoroso, ou devemos dizer "quadrado", já que a foto da antiga namorada assombra o protagonista até quase o fim da história? Sem contar a incoerência sobre a qual a história é construída: o rapaz que, dois anos depois de abandonado pela namorada, ainda tentava dar adeus à vida, de repente se vê dividido entre duas mulheres. É claro que a vida é complexa e o psiquismo ainda incompreensível, mas quando o diretor abusa dessas premissas, corre o risco de ser rejeitado.
O maior problema, na minha opinião, é que o filme não consegue alçar voo. Triste, pois ele faz algumas brilhantes tentativas. Além dos bons desempenhos de Gwyneth Paltrow, Joaquim Phoenix e Isabella Rossellini - eles fizeram tudo o que podiam com o roteiro que tinham -, os cenários são precisos. Os da casa do rapaz e da tinturaria de seu pai pintam muito bem os domínios de uma família de classe média baixa por demais presa ao passado.
E, no que toca às personagens, chamo atenção para a mãe do protagonista, interpretada por Isabella Rossellini, assustadoramente parecida com sua mãe Ingrid Bergman nos gestos, no rosto e na voz.
Os trajes dos anos 40 usados por ela, tão semelhantes aos que sua mãe usou em filmes como "Arco do Triunfo" ou "Interlúdio", expressam com alguma crueldade a distância entre o glamour das personagens de Ingrid e a ostentação pueril e fora de lugar desta personagem de Isabella. Isso, somado às bolinhas de naftalina que deixam sua casa cheirando à casa de vó, estendem à família do protagonista o deslocamento vivido por ele.
É uma pena que tantos elementos interessantes se percam no meio de situações e diálogos mal construídos. Do contrário, teríamos um filme que certamente seria lembrado por muito tempo.

domingo, 20 de setembro de 2009

Gloria Swanson & Cecil B. DeMille

Quem gosta dos clássicos de Hollywood certamente já passou por "Crepúsculo dos Deuses" (1950), o mais contundente filme sobre os bastidores da capital do cinema e, em minha opinião, um dos melhores filmes de todos os tempos. Depois de passear pelos extras da baratíssima edição de "Sunset Boulevard" distribuída pela Paramount, é bastante provável que o espectador se sinta compelido a procurar os filmes em que Miss Gloria Swanson foi dirigida por Cecil B. DeMille: retratado em "Sunset..." como um atarefado diretor que nem remotamente deseja tirar do ostracismo a outrora famosa atriz muda. É também possível que esse espectador procure saber um pouco mais sobre os outros artistas esquecidos que também comparecem no filme de Billy Wilder (Erich Von Stroheim, Hedda Hopper, Buster Keaton). Eu, pelo menos, saí atrás de toda essa gente.

O passeio me levou até "Don't change your husband" (1918), "Male and Female" (1919), "Why change your wife" (1920) e "The affairs of Anatol", películas em que uma Gloria Swanson no auge de sua juventude, beleza e popularidade é dirigida por Cecil B. DeMille.



Essas películas exemplificam bastante bem as diretrizes que determinavam o trabalho de DeMille
nos anos de 1910 e 1920. São comédias que seguem a linha das comédias de costumes teatrais, que buscam corrigir os vícios pelo riso. Daí a algumas delas não terem muita graça, por tentarem defender uma middle class morality de modo demasiado intencional. Por exemplo, a primeira e a terceira, "Não troque de marido" e "Porque trocar de esposa?", respectivamente. A apresentação do casal assemelha-se. No primeiro filme, a câmera delicia-se em apresentar pouco a pouco um marido relaxado: ele joga a sujeira do cachimbo no chão da sala, coloca os sapatos sujos sobre o lenço imaculado da esposa e não dá qualquer atenção a ela. A pobrezinha, que anseia por romance, encontra-o pouco depois no galanteador que a distraía no jantar em comemoração ao aniversário de casamento dela - ao qual o marido se esquecera de comparecer. No segundo é a vez de a câmera desnudar a pudica esposa que, por ser muito casta, acaba jogando o marido no colo de uma vamp (a hilária Bébé Daniels, num de seus muitos papéis de coquete espevitada). Num e noutro filme pululam as mensagens moralizantes do diretor, por meio de inúmeros intertítulos longuíssimos. A conclusão de ambos é: marido e mulher devem permanecer unidos para tentar resolver os problemas conjugais, pois nem sempre (nunca, de acordo com a filosofia demilliana) é bom negócio investir num novo consórcio. A leitura da questão é pretensamente inovadora quando DeMille propõe, em "Why change your wife", que a mulher deve deixar o puritanismo de lado para, de vez em quando ser também "amante" do marido. Porém, a dica parece servir unicamente ao objetivo de sustentar o lar burguês num momento em que não era tão difícil de se conseguir um divórcio (tanto que, nos dois filmes, o casal se divorcia, e os litigantes são punidos com segundos consórcios pouco deleitosos).
Além de acreditar que o casamento deveria durar até que a morte separasse o casal - mesmo que as diferenças já os tivessem separado muito antes -, outra crença alimentada pelo Sr. DeMille é a da estratificação das classes sociais, e isso fica muito claro em "Male and female", conto do mordomo que desejava a patroa rica mas, consciencioso de sua posição social, resolve casar-se com a criadinha sensaborona. O casamento entre a patroa e o empregado - enamorados um do outro - quase acontece. Isso enquanto ambos estão numa ilha deserta, onde vão parar depois que afunda o barco onde estão os ricos, o mordomo e a criada. Lá fundam uma nova sociedade, baseada na habilidade de cada um, e onde, pasmem, é a vez do esbelto mordomo tornar-se rei (literalmente). Só assim, superior à mocinha, ele poderia tê-la. O idílio dura pouco, pois os desaparecidos são resgatados, mas mesmo que não fossem, e que o casamento se consumasse, perduraria a visão machista do Sr. DeMille.

Mais agradável é "The affairs of Anatol", onde há mais bom humor na narração das situações em que se envolve o "cavalheiresco" jovem Anatol (interpretado pelo belo Wallace Reid num dos últimos papéis de sua breve carreira), sempre às voltas com a salvação das belas mulheres. Os intertítulos, apesar de continuarem longos, são sarcásticos: "O cavalheiro andante só quer fazer o bem, mas o que sua esposa pensa disso?"; "Se bem que ele não iria querer salvar a moça se ela não fosse tão bonita, e ela não iria querer ser salva se ele não tivesse os ombros tão largos", coisas do tipo. Além disso, as interpretações são bastante satisfatórias. Gloria faz uma mocinha recém-casada bem engraçada: frívola, tímida, ciumenta. Wallace Reid tem uns trejeitos hilários - destaque para a cena em que ele, depois de ser enganado por uma Dulcineia e abandonado na estrada pela esposa, olha para uns patos ("Greetings, brothers", diz o intertítulo). Bébé Daniels novamente aparece, e é uma das personagens mais interessantes dos silents de DeMille: uma vamp de aparências, que habita um misto de caverna do Drácula e pirâmide do Egito, e tenta vampirizar o bobo Reid no intuito de conseguir o dinheiro para a cirurgia de seu esposo.

No conjunto, a colaboração Gloria/Cecil deixou produções de inegável valor histórico, mas que não são vistas com muito prazer nos dias de hoje. Não me agrada o modo como ele pinta as mulheres: ou bonecas tolas, seduzidas por galanteadores baratos, ou mulheres descaradas, desejosas especialmente de limpar os bolsos dos homens. E pinta de modo grave, quase sempre com o dedo em riste. Por isso, me diverti tanto com Bébé na pele da mulher casada que amava o esposo e para quem o vampirismo era meramente uma carreira artística... Mas, por outro lado, nesses filmes DeMille pôde vestir Gloria com os trajes mais extraordinários do final de 10 e começo de 20. E que, na época, fizeram tremendo sucesso inclusive por aqui. Não posso deixar de pensar o quanto a descrição de uma das personagem do João do Rio teve influência da atriz: "O seu passo tango, o exagero das modas, que lhe davam o aspecto semipersa (...)" (abaixo e acima há uma porção de fotos da atriz usando trajes estravagantes).
Gostei muito de ver esses filmes, que esclarecem a leitura inteligente que Billy Wilder e Gloria Swanson fazem da época - e a leitura irritou DeMille, o qual rompeu relações com Wilder, segundo a trívia hollywoodiana. Mas prefiro Gloria em "Sadie Thompson", (1928) ou então no sonoro "It's tonight or never" (1931). Aliás, sobre este, meu preferidíssimo, ainda falarei futuramente.






sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Um filme antigo, um livro antigo e uma emoção sempre nova

Tenho nas mãos as duas mais deliciosas descobertas que fiz nesses últimos tempos: um livro de António Ferro, um filme de Ernst Lubitsch. Os dois me permitiram casar deleite e vida profissional - melhor que isso, impossível. O livro, na verdade, são dois. Hollywood, capital das imagens e Novo mundo, mundo novo, compilação das crônicas sobre os Estados Unidos que o escritor português publicou numa das folhas de seu país. No título, referi-me ao segundo, que me proporcionou o prazer de recortar suas folhas antes de iniciar a leitura - prazer do qual só podemos usufruir, hoje, ao termos a sorte de comprar um livro antigo cuja cópia nunca tenha sido lida.
Minha viagem pelo Mundo Novo desfraldado por António Ferro já começou empolgante, empolgação que só fez crescer à medida em o escritor, jornalista do Diário de Notícias, se aproximava de seu destino principal: a Hollywood dos anos 20... Difícil um cinéfilo não invejar a aventura do intelectual, que, além de publicar seu encontro com Mary Pickford e outras "estrelas" e "astros" do "écran" (como essa palavra é repetida por ele...), ainda estampa, no primeiro livro, sua fotografia com Douglas Fairbanks. Difícil um analista crítico da Hollywood dos anos dourados não se surpreender com a empolgação, a paixão, o abandono com que o escritor olhava as ruas, hotéis, cenários e artistas que povoavam aquela terra de sonhos.
Olhava para deslindar aos seus patrícios a verdadeira capital do cinema, aquela em que uma rua deserta do far-west dava numa rua gelada de Nova Iorque, em que as cabines de passageiros de um navio ficavam a quilômetros de distância de sua proa. Mas, mesmo depois de conhecer a realidade, e de insistir para que a "pequenina luz que sonha com as estrelas" não deixasse Portugal imaginando uma vida de celebridade em Hollywood, mesmo assim o cronista não deixava de olhar com fascínio para a ficção que surgia dessa realidade tão disparatada. Seu enamoramento por Mary Pickford é prova disso: "Basta dizer Mary... Mary Pickford, casada com Douglas, está casadinha, também, com os olhos de todos, olhos amorosos, olhos que a beijam... Amor respeitoso, amor cristão... Mary Pickford é a Nossa Senhora da Luz Branca!...".
Que bonitinho!... Fascinante conhecer uma opinião tão apaixonada vinda do tão ajuizado escritor modernista. Porque, afinal de contas, quem não se sente mais ou menos assim ao assistir a um filme favorito? Mesmo que os extras do DVD divulguem os detalhes que se escondem por detrás das lentes da câmera, continuamos rindo e nos emocionando com as histórias por ela contadas.
Por exemplo, com "Alvorada do amor" (The love parade), o primeiro filme sonoro dirigido por Ernst Lubitsch, ainda em 1929 (na alvorada do som) dois anos depois da visita de Ferro a Hollywood. Embora Ferro tenha dito não gostar "de fitas faladas", é bem provável que tenha visto esta, pois deixa claro a admiração que sentia por Maurice Chevalier - na película, o namorador de Silvânia que é convocado de volta a seu país depois de escandalizar a já escandalosa Paris. Sobre ele, Antonio Ferro diz: "O êxito de Maurice Chevalier é a sua completa adaptação ao espírito da época. Maurice é o tipo-símbolo, a soma de muitas parcelas: dandismo do faubourg, perfume de boîte-à-chansons, sabor de garçonnière, passos da Broadway, sugestão cinegráfica no claro-escuro do chapéu de palha e do negro do smoking, graça enfant terrible e máscara de Bébé Cadum, Place Pigalle e Times Square, ginástica das oito às nove e amor das cinco às sete, cartazes nos tapumes avec le sourire e bilhetes postais emoldurados nas tapeiras, Sour les toits de Paris uma elegância de apache disfarçado (...)".
Depois de ver Maurice em um de seus filmes, é impossível discordar do escritor. Que dirá, então, depois de vê-lo nesse filme, anterior à censura que os estúdios cinematográficos se impuseram, filme que dosa tão bem o romance, o sexo, a ironia e a comédia, amarrando-os tão bem - porque, na verdade, o mundo não passa de uma longuíssima comédia dos sexos... Exemplo cabal da aptidão do conde Alfred Renard pelas mulheres é aquela cena inicial, em que ele tenta administrar duas amantes, enfrenta o marido de uma delas e, imperdíveis reviravoltas depois, abotoa o vestido da moça sob os olhos do agradecido e apaixonado marido dela. E, então, a cena em que o conde, já convocado de volta à Silvânia, canta a rainha (e para a rainha): "Loves I've known are buried in the past/ They could last with you/ None of them could ever hold me fast/ In the way you do. (...)/ Eyes of Lisette, smile of Mignonette/ The sweetness of Suzette/ In you displayed/ Grace of Delphine, charm of Joséphine/ The cuteness of Pauline/ In you, arrayed.". Essa cantada debochada, bem ao estilo de Chevalier, é uma delícia e merece ser vista:



Esta estudante de literatura e teatro teve, ainda, uma grata surpresa ao encontrar neste filme
tantos elementos do teatro cômico-musicado: o par romântico, a comédia física, os trocadilhos sexuais, números musicais atados mais ou menos frouxamente à ação - e neles, os duetos românticos. Estrutura usada nos palcos da França, de Portugal, do Brasil, e depois tão bem aproveitados por esse mestre da comédia ligeira que é Lubitsch. Infelizmente, Hollywood não o deixou ser tão alegre e saltitante por tanto tempo... Então, vale a pena aproveitar esse filme, imperdível para quem quer conhecer uma das mais bem acabadas matrizes dos musicais da capital do cinema. E também para quem quer ver a bela Jeanette MacDonald no primeiro e mais livre papel de sua carreira.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Beijos a la Garbo

Tudo começou com a Cris dizendo que estava juntando as cenas de beijo da Greta Garbo para fazer uma homenagem, já que a Greta faria aniversário dia 18 deste mês. Aí me lembrei da sequência final de "Cinema Paradiso", em que o homem amargo volta a ser menino vendo todas as cenas de beijo censuradas pelo padre da cidadezinha onde morava: herança do velho projetista que ensinou o rapazinho a amar o cinema. Então, decidi fazer uma paródia da antológica sequência usando uns beijos que a Miss Garbo dá em homens, adolescentes, mulheres e crianças. Toda a liberalidade daqueles "Good old days", apanhada com tanta graça por Cole Porter em "Anything goes" - "In olden days a glimpse os stocking/ Was looked on as something shocking,/ But now, God knows/ Anything goes" - merecia uma música igualmente animada. Escolhi a alegrinha "Kiss me", que não chega aos pés daquele alegríssimo tempo, mas dá uma ideia dele...
Na sequência, há o beijo que a Leonora Moreno de "Torrent" (primeiro papel hollywoodiano da atriz, em 1926) dá no namorado de infância, o qual tinha acabado de fugir da festa de seu casamento para passar a lua-de-mel com a ex-namorada; o beijo puro que a femme fatale de "The temptress" troca com a personagem de Ricardo Moreno (1926); o beijo proibido que a mulher casada (e que já tinha um amante) dá no rapazote de "The Kiss" (1929), sob os olhos do marido que acabava de chegar; o beijo tremendamente erótico que Marguerite Gautier dá em Armand no "A dama das camélias" (1936); o beijo russo (!) que a objetiva Ninotchka dá no conde Léon no filme homônimo (1939); o beijo homossexual que a rainha Cristina dá em sua protegida no "Rainha Cristina" (1934); o beijão que Felicitas (também casada...) dá em Leo no "Flesh and the Devil (1926); o beijo maternal da emancipada Arden Stuart em "The single standard" (1929); o beijo que a vítima de guerra desmemoriada de "As you desire me" (1932) troca com a personagem de Melvin Douglas (um dos seus mais frequentes galãs); o legendário beijo-de-boca-entreaberta que uma Felicitas dominadora dá num Leo sucumbido em "Flesh and the devil"; os beijos ambíguos que a Katrin de "The painted veil" (1934) dá na irmã mais nova, a qual estava deixando a casa depois de se casar com um brutamontes; outro beijo trocado entre os protagonistas de "Torrent"; o beijo final trocado entre a personagem de Greta e a de Clark Gable em "Susan Lenox, her fall and rise", um dos poucos filmes em que a atriz fica com o mocinho no final. Aí está minha homenagem meio brincalhona a essa atriz que é uma das minhas preferidas.
Abaixo, coloquei a maravilhosa sequência final do "Cinema Paradiso" (1988), a cena mais linda que eu já vi, com aquela música (de Ennio Morricone) que me nocauteia logo no primeiro acorde.